Onde terá nascido o Bisavô de Jorge Luís Borges ?!

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Onde terá nascido o Bisavô de Jorge Luís Borges ?!

#85673 | jpbabc | 06 mar 2005 16:05

Caros Amigos,


Há algum tempo atrás li num suplemento do DN de 25 de Outubro de 1998 uma curiosa notícia sobre a ascendência portuguesa do escritor Jorge Luís Borges. Caso haja alguém interessado em prosseguir as buscas sobre a ascendência deste escritor universal, leia o texto que se segue da autoria de Tiago Rodrigues.

Boas leituras e continuação de um bom fim-de-semana,

José Pedro Castro





O Bisavô Português


Jorge Luis Borges sempre se orgulhou das suas raízes portuguesas e interessou-se muito pelos antepassados quando visitou o nosso país, em 1921 e 1984. Sabia-se que o seu bisavô, Francisco Borges, saiu um dia de Torre de Moncorvo com destino ao Rio da Prata. Em Trás-os-Montes, procurámos o rasto de homem que deu ao grande escritor o seu apelido.

Tiago Rodrigues

Rondaria os vinte e dois anos quando visitou Portugal. Em 1921, Jorge Luis Borges findava uma estadia de três anos em Espanha com a família. Conhecera Valle-Inclán, lera Unamuno e vertera poetas germânicos para castelhano. É então que chega ao nosso país com o propósito de encontrar esses seus «mayores», a «vaga gente» do seu sangue. Cinquenta anos mais tarde, contará numa entrevista como tentou auscultar o paradeiro da família do seu bisavô português: «Quando consultámos a lista telefónica, havia tantos Borges que era como se não existisse nenhum. Tinha cinco páginas de parentes. O infinito e o zero assemelham-se. Não podia telefonar a cinco páginas de pessoas e perguntar: "Diga-me uma coisa: na sua família houve um capitão chamado Borges, que embarcou para o Brasil em fins do século XVIII ou princípios do XIX?..." No entanto, descobri com tristeza que um inimigo de Camões se chamava Borges e tiveram um duelo».
Regressa a Portugal em 1984. Declara que essa visita é também uma homenagem ao seu bisavô português, Francisco Borges. Nessa ocasião, afirma saber que Torre de Moncorvo era a terra natal desse antepassado. Em Lisboa, numa visita ao Grémio Literário, encontra-se com representantes da autarquia de Moncorvo, que o declaram cidadão honorário da pequena vila do nordeste transmontano. Borges quis saber coisas sobre essa terra do bisavô Francisco, da qual já ouvira falar, mas nunca chegou a visitá-la.
Por essa altura, algumas redacções enviam jornalistas para a vila. É descoberta uma família Borges, ao que parece antiga, numa aldeia do concelho. Felgueiras, terra de famílias judaicas e de apicultores, parecia ser o ponto de partida desse homem que viajou até à América do Sul para oferecer outro sotaque ao seu apelido. Apesar da precariedade das provas, a tal família é apresentada como a raiz portuguesa do grande escritor argentino. Mas essa hipótese, essa pista genealógica, está condenada a cair por terra, uma vez que dos Borges de Felgueiras só há registo a partir do final do século XIX. As origens transmontanas do homem que escreveu «O Aleph» são, obviamente, muito mais remotas.
A Biblioteca Municipal de Moncorvo seria local inevitável a ser visitado por Jorge Luís Borges, numa hipotética estadia na terra dos seus antepassados. Quem seguisse esse roteiro imaginário, acabaria por encontrar António Júlio Andrade, bibliotecário e director do jornal «Terra Quente». Homem que se ocupa dos arquivos, ele tem procurado Francisco Borges em todo o tipo de registos e correspondências. Alguns dos documentos que descobriu são inéditos e permitem uma indicação mais precisa da sua origem. Que pode muito bem estar no Morgadio do Mindel, o mais antigo de que há conhecimento na comarca de Moncorvo, pertencente a uma outra família Borges muito anterior à de Felgueiras. Esta família possuía, além de algumas casas na vila (agora já desaparecidas), uma quinta na Vilariça - os campos mais férteis do concelho - e todo o território da aldeia de Peredo dos Castelhanos.
O argentino D. Luis Guillermo de Torre, parente de Jorge Luis Borges e membro da Comissão Heráldica da Argentina, forneceu dados biográficos fundamentais sobre Francisco Borges. «Terá sido baptizado numa das paróquias de Moncorvo, talvez em 1782. Era filho de Manuel António Cardoso e de Maria Antónia. Ignora-se o apelido da mãe, que se supõe ser Borges. Chegou ao Rio da Prata em 1817, na expedição do general Lecor. Casou em Montevideu, em 3 de Fevereiro de 1829, com a argentina Carmen Lafinur». Deste casal nasceu o avô paterno Francisco Borges Lafinur, que se casaria com a inglesa Frances Haslam Arner. Este avô é evocado em 1969, no poema «Alusão à morte do coronel Francisco Borges (1833-74)». Guillermo de Torre também aponta a data de morte. «Morreu em Montevideu em 1837, com 55 anos. Daí a data apontada para o seu nascimento». Estes são dados porventura recolhidos junto da família. E quanto aos que referem Torre de Moncorvo como sua terra natal, apoiam-se provavelmente em recordações do que Francisco Borges teria eventualmente contado. Talvez seja também esta, de resto, a justificação para o facto de Jorge Luís Borges mencionar Moncorvo, quando nos visitou em 1984.
Tudo indica, portanto, que Francisco Borges pertencesse aos tais Borges do Morgadio do Mindel. Família ainda mais portentosa porque dela fazia parte Frei Miguel da Madre de Deus, um homem que chegou a ser arcebispo de Braga. No seu tempo, esteve sempre nas boas graças do Príncipe Regente; hoje, ensombra a sacristia da Igreja Matriz de Moncorvo, a olhar-nos de uma moldura. É por este ilustre antepassado que é possível encontrar uma árvore genealógica dos Borges. Isto porque a Igreja investigava a carga genética dos seus bispos, buscando qualquer rasto de sangue judeu até à sétima geração.
Guillermo Torre afirma que o pai de Francisco Borges se chamava Cardoso, um nome judeu. Talvez esse nome - como era comum acontecer - fosse revertido para um nome mais cristão, como Cruz, apelido bem usual entre os Antónios da família Borges de Moncorvo. A possível alteração dos nomes de origem judaica torna muito difícil descobrir a filiação de Francisco Borges na árvore genealógica de Frei Miguel, mas há vários casais cujos primeiros nomes e datas de nascimento coincidem com os que poderiam ser os dos seus pais. Se procurarmos o próprio Francisco Borges, encontramos três homens, nascidos à volta de 1780, com esse nome. Todos eles irmãos e sobrinhos de Frei Miguel. Um deles até nascido em 1782, data apontada para o nascimento do bisavô português de Jorge Luís Borges. Só que este foi cavaleiro fidalgo e vereador da Câmara de Moncorvo numa data posterior à da partida da armada do general Lecor para o Rio da Prata.
As coincidências levam a acreditar que, investigando mais a fundo, encontraríamos Francisco Borges nesta família de Torre de Moncorvo. Entretanto, existe pelo menos uma prova irrefutável de que ele nasceu nesta vila: o registo dos homens que, com a Sétima Companhia de Fuzileiros, embarcaram em 1821 para o Rio da Prata. Este documento, do Arquivo Histórico Militar, revela que dois homens com o nome de Francisco Borges partiram nessa armada do general Lecor. Ambos tinham nascido na comarca de Moncorvo. Um era alferes e outro tenente. Mas nenhum outro dado nos permite apontar se algum deles era o futuro bisavô do homem que escreveu «O Jardim dos Caminhos que se Bifurcam».
Em Torre de Moncorvo, o escritor dá hoje o nome a uma avenida moderna. A Av. Jorge Luís Borges, de bom asfalto, onde fica o terminal das carreiras. Lugar de chegada e partida, lugar onde se cruzam pessoas e mercadorias. Mesmo ao alto da avenida, está uma fonte antiga, que se chama de Santo António, da qual se diz que quem beba aquela água há-de casar em Moncorvo. Esquivo também antes da morte, o bisavô Francisco foi casar à Argentina.

Os Borges
Nada ou pouco sei dos meus ancestrais
Portugueses, os Borges: vaga gente
Que na minha carne, obscuramente,
Prossegue seus hábitos, temores e rituais.
Ténues como se nunca houvessem existido
E alheios aos trâmites da arte,
Indecifravelmente fazem parte
Do tempo, da terra e do que é esquecido.
Melhor assim. Cumprida a odisseia,
São Portugal, são a famosa gente
Que forçou as muralhas do Oriente
E se deu ao mar e a outro mar de areia.
São o rei que no místico deserto
Se perdeu mas jura estar perto.
(tradução de José Mário Silva)

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RE: Onde terá nascido o Bisavô de Jorge Luís Borges ?!

#85722 | fg | 07 mar 2005 13:07 | Em resposta a: #85673

É conhecido o grande interesse que este genial escritor tinha em conhecer as suas raízes. "É sábio quem conhece os seus pais; mais sabe é quem conhece os seus avós", dizia o autor de "ALEPH". Parece-me deveras interessante que alguém neste forum tenha a curiosidade em procurar as raízes de sábios da índole de um José Luis Borges; são os grandes génios entrando nesta praça, uma Ágora com mais encanto, não há dúvida; não serão eles a verdadeira aristocracia?
F. Guimarães

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RE: Onde terá nascido o Bisavô de Jorge Luís Borges ?!

#85723 | fg | 07 mar 2005 13:12 | Em resposta a: #85673

Quis dizer Jorge Luis Borges e não José Luis Borges. Peço desculpa.
F. Guimarães

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RE: Onde terá nascido o Bisavô de Jorge Luís Borges ?!

#85726 | Carlos Silva | 07 mar 2005 13:36 | Em resposta a: #85722

No Arquivo Historico Militar deveria talvez haver noticia do oficial Francisco Borges.

C. Silva

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RE: O que é a nobreza em Ortega y Gasset ?

#85733 | jpbabc | 07 mar 2005 16:00 | Em resposta a: #85722

Caro F. Guimarães,


A interrogação que faz sobre se a verdadeira aristocracia não seria a dos pensadores e literatos, fez-me evocar, de repente, o grande Ortega y Gasset, que esteve exilado em Lisboa (no nº 116 da Rua de S. Bernardo) durante a guerra civil espanhola (1936-9) e que reflectiu com subtileza e apuro, a essência do que deve ser a nobreza humana, na sua obra “A Rebelião das Massas”, escrita em 1930.

Neste trabalho, Ortega y Gasset discorre sobre a situação moral da Europa de entre as duas guerras; recusa a habitual referência económica às classes sociais, distinguindo dois tipos de homens, a saber, as “elites” e as “massas”; os primeiros beneficiam de qualidades de ordem intelectual, espiritual e estética, os segundos (“homens-massa”), qualquer que seja a sua origem social, são incultos, recusam o exemplo das elites e caem, assim, no hedonismo e na vulgaridade; esta crítica junta-se, por um lado, à do poder e do mundo do dinheiro e, por outro, à do técnico hiper-especializado, que estigmatiza o esquecimento dos valores humanistas.

Leia-se um excerto desta obra (tradução brasileira) e em particular, o seu capítulo VII.

Os meus cumprimentos,

José Pedro Castro






VII. VIDA NOBRE E VIDA VULGAR, OU ESFORÇO E INÉRCIA

Somos aquilo que nosso mundo nos convida a ser, e as feições fundamentais de nossa alma são impressas nela pelo perfil do contorno como por um molde. Naturalmente: viver não é mais que tratar com o mundo. O semblante geral que ele nos apresenta será o semblante geral de nossa vida. Por isso insisto tanto em fazer notar que o mundo de onde nasceram as massas actuais mostrava uma fisionomia radicalmente nova na história. Enquanto no pretérito viver significava para o homem médio encontrar a sua volta dificuldades, perigos, escassez, limitações de destino e dependência, o mundo novo aparece como um âmbito de possibilidades praticamente ilimitadas, sem dúvida, onde não se depende de ninguém. À volta desta impressão primária e permanente vai se formar cada alma contemporânea, como em volta da oposta se formaram as antigas. Porque esta impressão fundamental se converte em voz interior que murmura sem cessar umas como palavras no mais profundo da pessoa e lhe insinua tenazmente uma definição da vida que é, ao mesmo tempo, um imperativo. E se a impressão tradicional dizia: "Viver é sentir-se limitado e, por isso mesmo, ter de contar com o que nos limita", a voz novíssima grita: "Viver é não encontrar limitação alguma; portanto, abandonar-se tranquilamente a si mesmo. Praticamente nada é impossível, nada é perigoso e, em princípio, ninguém é superior a ninguém".

Esta experiência básica modifica por completo a estrutura tradicional, perene, do homem-massa. Porque este se sentiu sempre constitutivamente condicionado a limitações materiais e a poderes superiores sociais. Isto era, a seus olhos, a vida. Se lograva melhorar sua situação, se ascendia socialmente, atribuía-o a um golpe da sorte, que lhe era nominativamente favorável. E quando não a isto, a um enorme esforço e ele sabia muito bem quanto lhe havia custado. Em um e outro caso tratava-se de uma excepção à índole normal da vida e do mundo; excepção que, como tal, era devida a alguma causa especialíssima.

Mas a nova massa encontra a plena franquia vital como estado nativo e estabelecido, sem causa especial nenhuma. Nada de fora a incita a reconhecer nela própria limites e, portanto, a contar em todo momento com outras instâncias, sobretudo com instâncias superiores. O labrego chinês acreditava, até há pouco, que o bem-estar de sua vida dependia das virtudes privadas que possuísse o seu Imperador. Portanto, sua vida era constantemente regulada por esta instância suprema de que dependia. Mas o homem que analisamos habitua-se a não apelar de si mesmo a nenhuma instância fora dele. Está satisfeito tal como é. Ingenuamente, sem necessidade de ser vão, como a coisa mais natural do mundo, tenderá a afirmar e considerar bom tudo quanto em si acha; opiniões, apetites, preferências ou gostos. Por que não, se, segundo vemos, nada nem ninguém o força a compreender que ele é um homem de segunda classe, limitadíssimo, incapaz de criar nem conservar a organização mesma que dá à sua vida essa amplitude e esse contentamento, nos quais baseia tal afirmação de sua pessoa ?

Nunca o homem-massa teria apelado a nada fora dele se a circunstância não lhe houvesse forçado violentamente a isso. Como agora a circunstância não o obriga, o eterno homem-massa, consequente com sua índole, deixa de apelar e sente-se soberano de sua vida. Contrariamente, o homem selecto ou excelente está constituído por uma íntima necessidade de apelar de si mesmo a uma norma além dele, superior a ele, a cujo serviço livremente se põe. Lembre-se de que, no início, distinguíamos o homem excelente do homem vulgar dizendo: que aquele é o que exige muito de si mesmo, e este, o que não exige nada, apenas se contenta com o que é e está encantado consigo mesmo. Contra o que sói crer-se, é a criatura de selecção, e não a massa, quem vive em essencial servidão. Sua vida não lhe apraz se não a faz consistir em serviço a algo transcendente. Por isso não estima a necessidade de servir como uma opressão. Quando esta, por infelicidade, lhe falta, sente desassossego e inventa novas normas mais difíceis, mais exigentes, que a oprimam. Isto é a vida como disciplina - a vida nobre -. A nobreza define-se pela exigência, pelas obrigações, não pelos direitos. Noblesse oblige. "Viver a gosto é de plebeu: o nobre aspira a ordenação e a lei" (Goethe). Os privilégios da nobreza não são originariamente concessões ou favores, mas, pelo contrário, são conquistas, e, em princípio, supõe sua conservação que o privilegiado seria capaz de reconquistá-las em todo instante, se fosse necessário e alguém se lho disputasse. Os direitos privados ou privilégios não são, pois, posse passiva e simples gozo, mas representam o perfil onde chega o esforço da pessoa. Contrariamente, os direitos comuns, como são os "do homem e do cidadão", são propriedade passiva, puro usufruto e benefício, tão generoso do destino com que todo homem se encontra, e que não corresponde a esforço algum, como não seja o respirar e evitar a demência. Eu diria, pois, que o direito impessoal se tem e o pessoal se mantém.

É irritante a degeneração sofrida no vocabulário usual por uma palavra tão inspiradora como "nobreza". Porque ao significar para muitos "nobreza de sangue" hereditária, converte-se em algo parecido aos direitos comuns, numa qualidade estática e passiva, que se recebe e transmite como uma coisa inerte. Mas o sentido próprio, o étimo do vocábulo "nobreza" é essencialmente dinâmico. Nobre significa o "conhecido", entende-se o conhecido de todo o mundo, o famoso, que se deu a conhecer sobressaindo sobre a massa anónima. Implica um esforço insólito que motivou a fama. Nobre, pois, equivale a esforçado ou excelente. A nobreza ou fama do filho já é puro benefício. O filho é conhecido porque seu pai conseguiu ser famoso. É conhecido por reflexo, e, com efeito, a nobreza hereditária tem um carácter indirecto, é luz espelhada, é nobreza lunar como feita com mortos. Só fica nela de vivo, autêntico, dinâmico, a incitação que produz no descendente a manter o nível de esforço que o antepassado alcançou. Sempre, ainda neste sentido desvirtuado, noblesse oblige. O nobre originário obriga-se a si mesmo, e ao nobre hereditário obriga-o a herança. Há, de qualquer modo, certa contradição na transferência da nobreza, desde o nobre inicial a seus sucessores. Mais lógicos os chineses, invertem a ordem da transmissão, e não é o pai quem enobrece o filho, mas o filho quem, ao conseguir a nobreza, a comunica a seus antepassados, destacando com o seu esforço sua estirpe humilde. Por isso, ao conceder os níveis de nobreza, graduam-se pelo número de gerações passadas que ficam prestigiadas, e há quem só torna nobre seu pai e quem alonga sua fama até o quinto ou décimo avô. Os antepassados vivem do homem actual, cuja nobreza é efectiva, actuante; em suma: é; não, foi.

A "nobreza" não aparece como termo formal até o Império romano, e precisamente para opô-lo à nobreza hereditária, já em decadência.
Para mim, nobreza é sinónimo de vida esforçada, posta sempre a superar-se a si mesma, a transcender do que já é para o que se propõe como dever e exigência. Desta maneira, a vida nobre fica contraposta à vida vulgar e inerte, que, estaticamente, se reclui a si mesma, condenada à perpétua imanência, caso uma força exterior não a obrigue a sair de si. Daí que chamemos massa a este modo de ser homem - não tanto porque seja multitudinário, quanto porque é inerte.

À medida que se avança pela vida, vamos nos fartando de advertir que a maior parte dos homens - e das mulheres - são incapazes de outro esforço que o estritamente imposto como reacção a uma necessidade externa. Por isso mesmo ficam mais isolados, e como monumentalizados em nossa experiência, os pouquíssimos seres que conhecemos capazes de um esforço espontâneo e luxuoso. São os homens selectos, os nobres, os únicos activos e não só reactivos, para os quais viver é uma perpétua tensão, um incessante treinamento. Treinamento = áskesis. São os ascetas.

Não surpreenda esta aparente digressão. Para definir o homem-massa actual, que é tão massa como o de sempre, mas quer suplantar os excelentes, é preciso contrapô-lo às duas formas puras que nele se mesclam: a massa normal e o autêntico nobre ou esforçado.

Agora podemos caminhar mais depressa, porque já somos donos do que, a meu juízo, é a chave ou equação psicológica do tipo humano dominante hoje. Tudo que vem depois é consequência ou corolário dessa estrutura radical que poderia resumir-se assim: o mundo organizado pelo século XIX, ao produzir automaticamente um homem novo, intrometeu nele formidáveis apetites, poderosos meios de toda ordem para satisfazê-los - económico, corporais (higiene, saúde média superior à de todos os tempos), civis e técnicos (entendo por estes a enormidade de conhecimentos parciais e de eficiência prática que hoje o homem médio possui e de que sempre careceu no passado) -. Depois de haver estabelecido nele todas estas potências, o século XIX o abandonou a si mesmo, e então, seguindo o homem médio sua índole natural, fechou-se dentro de si. Desta sorte, encontramo-nos com uma massa mais forte que a de nenhuma época, mas, a diferença da tradicional, hermética em si mesma, incapaz de atender a nada nem a ninguém, acreditando que se basta - em suma: indócil. Continuando as coisas como até aqui, cada dia se notará mais em toda a Europa - e por reflexo em todo o mundo - que as massas são incapazes de se deixar dirigir em nenhuma ordem. Nas horas difíceis que chegam para nosso continente, é possível que, subitamente angustiadas, tenham um momento a boa vontade de aceitar, em certas matérias especialmente angustiosas, a direcção de minorias superiores.

Mas ainda essa boa vontade fracassará. Porque a disposição radical de sua alma está feita de hermetismo e indocilidade, porque lhe falta de nascença a função de atender ao que está além dela, sejam factos, sejam pessoas. Quererão acompanhar a alguém, e não poderão. Quererão ouvir, e descobrirão que são surdas.

Por outra parte, é ilusório pensar que o homem médio vigente, por muito que tenha ascendido seu nível vital em comparação com o de outros tempos, poderá reger, por si mesmo, o processo da civilização. Digo processo, não já progresso. O simples processo de manter a civilização actual é superlativamente complexo e requer subtilezas incalculáveis. Mal pode governá-lo este homem-massa que aprendeu a usar muitos aparelhos de civilização, mas que se caracteriza por ignorar de raiz os próprios princípios da civilização.

Reitero ao leitor que, paciente, tenha lido até aqui, a conveniência de não entender todos estes enunciados atribuindo-lhes, imediatamente, um significado político. A actividade política, que é de toda a vida pública a mais eficiente e mais visível, é, contrariamente, a derradeira, resultante de outras mais íntimas e impalpáveis. Assim, a indocilidade política não seria grave se não proviesse de uma mais profunda e decisiva indocilidade intelectual e moral. Por isso, enquanto não tenhamos analisado esta, faltará a última claridade ao teorema deste ensaio.

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RE: O que é a nobreza em Ortega y Gasset ?

#85791 | fg | 08 mar 2005 12:38 | Em resposta a: #85733

Caro José Pedro Castro

Que visionário este nosso Ortega y Gasset, que actual é este texto, é terrível o marasmo, a apatia profunda e estagnação das chamadas "elites".
"elite s.f. (gal.) a flor, o escol, o que há de melhor na sociedade (Fr. élite)" Dicionário da Lingua Portuguesa da Porto Editora.
É evidente que a nobreza tem obrigações (afinal, o que é a nobreza?); a nobreza não é um espaço estático, parado ou imóvel; a nobreza, se me permite a metáfora, é como uma sala onde se permite entrar e onde se convida a saír, de acordo com o cumprimento ou a não observância de certos requisitos. Nunca as nossas elites foram tão aborrecidas, maçadoras, incultas, sem a mais mínima inquietude; como se pode falar de ascese (a ascese era para os pitagóricos, socráticos e cínicos uma espécie de treino de si mesmos) numa sociedade onde se maximiza a economia? como é que se pode apelar aos valores humanistas, quando vivemos numa época em que a especialização se impõem, onde os valores da Ilustração se vão esquecendo deliberadamente, essa capacidade que os homens têm em determinar as suas vidas e alcançar a maturidade?
É absolutamente necessário que as nossas elites tenham a consciência de que não são algo dado previamente de uma vez por todas, algo "programado" de antemão, mas que somos sempre aquilo que queremos ser, a nossa capacidade de nos inventarmos, de transgredirmos os nossos limites. E quando falo da transgrssão dos limites e fronteiras, refiro-me à falta de curiosidade e inquietude generalizada dentro das nossas "elites". Ortega y Gasset dizia que "eu sou eu e as minhas circunstâncias"- a nossa situação histórica, a nossa classe social, as nossas condições fisicas /Psíquicas, enfim os os obstáculos que a nossa sociedade opõem aos nossos projectoas; no entanto, a liberdade humana é também a vocação de negar o que nos rodeia, e projectar outras realidades alternativas a partir das nossas paixões livremente assumidas.
No fundo trata-se da arte de viver e a estilização da existência, de governar a vida no sentido de lhe dar uma forma mais bela possível (aos olhos de nós próprios, dos outros e das gerações futuras para lhes servir de exemplo.) As elites deixaram de ser artífices de beleza.
Cumprimentos
Francisco Guimarães

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RE: Nobreza em Homero e no racionalismo cristão.

#85830 | jpbabc | 09 mar 2005 00:23 | Em resposta a: #85791

Caro Francisco Guimarães,


Compreendo a sua inquietação, por isso, lembrei-me de introduzir algum optimismo, recorrendo à sabedoria homérica em que a “arete”, ideal educativo grego, é entendida como um atributo próprio da nobreza, um conjunto de qualidades físicas, espirituais e morais tais como a bravura, a coragem, a força, a destreza, a eloquência, a capacidade de persuasão, numa palavra, a heroicidade.

E porque não evocar o racionalismo cristão com o seu código de 20 princípios para que todos possam andar firmes, a fim de que o infortúnio venha a ser substituído por alegrias e bonanças, salientando, desde já, o conceito de valor e nobreza ?

Para o racionalismo cristão, o valor e a nobreza evidenciam-se quando a pessoa sabe arcar, estoicamente, com a responsabilidade dos seus próprios actos, muito embora a sua atitude lhe traga pesados sacrifícios; arriscar a vida em proveito de outras vidas é um gesto de valor e nobreza; há também valor e nobreza em não denunciar a falha involuntária de criaturas indefesas, mesmo que o silêncio lhe seja desfavorável; valor e nobreza exigem discrição, orientação segura, critério bem firmado, raciocínio lógico, espírito de renúncia, abnegação e desprendimento; são qualidades geralmente exercidas pelos fortes, destemidos, pelos que têm bem sensível o sentimento de honra; estes nunca se aproveitam de uma fraqueza alheia para humilhar ou diminuir; o valor e a nobreza estão enquadrados nos altos preceitos espirituais.

Os meus cumprimentos,

José Pedro Castro

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RE: Nobreza em Homero e no racionalismo cristão.

#85853 | fg | 09 mar 2005 14:43 | Em resposta a: #85830

Caro José Pedro
Que interessantes são as sua dissertações, que gratificantes estes curtos momentos de reflexão; afinal a reflexão não é outra coisa que o distanciamento em relação aos resultados banais que nos dá o pensamento quando nos interrogamos sobre a vida (ou a morte, o ser e o nada).

Quanto ao racionalismo cristão, penso que a ascese cristã implica uma renúncia, enquanto que a ascese dos estóicos, e dos clásicos em geral, implica uma autotransformação, um exercício sobre nós próprios mediante o qual nos transformamos e cedemos a outro modo de ser. É o cuidado que exercemos sobre nós próprios e que implica um processo de transformação, uma superação de si mesmo (e esse cuidado pode-se traduzir na consigna délfica ou platónica "conhece-te a ti mesmo").

Quanto aos atributos da nobreza, não há dúvida que a virtude é uma palavra que indica uma certa relação de vigor; a ética tem necessariamente de ter uma dimensão de força. É necessária uma certa coragem para viver, generosidade para conviver e prudência para sobreviver.

Os meus cumprimentos

Francisco Guimarães

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RE: Onde terá nascido o Bisavô de Jorge Luís Borges ?!

#85855 | DABH | 09 mar 2005 16:05 | Em resposta a: #85723

Caro F. Guimarãres,

A propósito do seu engano lembrei-me de uma história sobre o mesmo autor.
Salvo erro de memória, Jorge Luís Borges foi um dia "assaltado" por uma senhora norte-americana que lhe transmitiu o enorme prazer de encontrar o grande escritor José Luis Borges", entregando-lhe um livro para que este o autografasse.

De imediato o escritor escreveu "para a Senhora X., José Luis Borges"!
Um amigo seu, testemunha do encontro, perguntou-lhe por que não a tinha corrigido?
Borges terá respondido - "Mas nunca se contraria uma Senhora, ainda por cima estadunidense!"

Com os melhores cumprimentos,
DABH

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RE: Miguel de Unamuno e o seu amor a Portugal.

#85859 | jpbabc | 09 mar 2005 18:20 | Em resposta a: #85853

Caro Francisco Guimarães,


Saindo um pouco do conceito de nobreza em vários autores clássicos e contemporâneos, não resisto em transcrever uma saborosa evocação que António Apolinário Lourenço fez na Antena 2, no dia 29 de Dezembro de 1996 sobre Miguel de Unamuno e o seu indisfarçável amor a Portugal e aos Portugueses; J. L. Borges, O. Gasset e agora M. Unamuno são autores que se relacionaram com o nosso País pelas razões mais diversas e que se deixaram seduzir pelo efeito telúrico lusitano…

O conceito que os outros têm a nosso respeito é importante para clarificarmos e relativizarmos os preconceitos que fazemos de nós próprios. Vejamos, então, Unamuno.

Creio bem que será do seu agrado.

Os meus cumprimentos,

José Pedro Castro





MIGUEL DE UNAMUNO E PORTUGAL


Poucos escritores estrangeiros estão tão indissoluvelmente ligados a Portugal, como este basco que nasceu em Bilbao em 29 de Setembro de 1864 e se chamou Miguel de Unamuno.

Sendo apenas dois anos mais velho do que Ramón de Valle-Inclán, há, contudo, maior desnivelamento etário relativamente aos seus restantes companheiros de geração — a famosa "geração de 98" —, diferença etária que, juntamente com a aura que desde cedo o envolveu, ajuda a explicar o seu ascendente junto desses mesmos companheiros. E efectivamente será Unamuno a lançar, desde logo com a sua exortação "adentro" (título que sintetiza a sua crença na necessidade de preferir o substancial e profundo ao superficial e acessório), a lançar, dizíamos, alguns dos grandes motivos e dos grandes combates geracionais, a busca do essencial espanhol, a ruptura com as regras fixadas pelo cânone do romance, o pessimismo pré-existencialista (bebido em Schopenhauer, Nietzsche e Kierkgaard, mas também em Antero de Quental) ou a questionação da unidade psíquica do sujeito.

Dois acontecimentos marcaram a infância bilbaína do escritor: com escassos seis anos perde o pai; com dez, assistirá a um dos acontecimentos mais espectaculares das chamadas "guerras carlistas" — o bombardeamento de Bilbao pelo exército rebelde, do qual haverá reflexos no romance fortemente autobiográfica Paz en la guerra, publicado em 1897. Depois dos estudos primários e secundários na sua cidade natal, Unamuno cursará Filosofia e Letras na Universidade de Madrid. Concluídos os estudos universitários com a leitura da tese de doutoramento em 1884 (com 20 anos), regressa a Bilbao, mas não consegue mais do que trabalho provisório como professor liceal. O ano de 1891, entretanto, será determinante na sua trajectória vital: casa com uma amiga de infância, Concepción Lizárraga, que será a mãe dos oito filhos do escritor, e, a 13 de Junho, toma posse do lugar de professor catedrático de Grego, na Universidade de Salamanca. É nos seus primeiros anos de Salamanca que começa a ler as obras de Marx, chegando a ingressar no Partido Socialista e a colaborar no jornal "La lucha de clases". O seu optimismo social será, contudo, interrompido pela crise religiosa de 1897. O escritor, que racionalmente não pode conceber a existência de Deus, vive atormentado com a ideia de que a morte física possa pôr fim completo à vida humana. Esse dilema não mais deixará de dominar a obra de Unamuno: a sua formação racionalista impede-o de aceitar a fé simples e não problemática dos demais, mas sente-se incapaz de fundamentar racionalmente a crença por que subjectivamente suspira. Desse antagonismo, e da absoluta necessidade do homem acreditar na sua imortalidade, advirá uma profunda angústia existencial. É ela o fundamento do "sentimento trágico da vida": "Podes conceber-te como não existindo?" — perguntava Unamuno. "Tenta-o; concentra nisso a tua imaginação e imagina-te a ti mesmo sem ver nem ouvir, nem tocar nem recordar nada; tenta-o e talvez chames e tragas para ti essa angústia que nos visita quando menos a esperamos, e sintas o nó que te aperta a garganta da alma".

Em 1900 é nomeado reitor da Universidade. Em 1914 — com o seu prestígio cimentado por um conjunto de livros de extrema importância, entre os quais se conta Del sentimiento trágico de la vida en los hombres y los pueblos (de 1913) — é destituído do cargo, por entre protestos provenientes de todos os quadrantes da vida cultural espanhola. Com a chegada ao poder do general Primo de Rivera, em 1923, Unamuno conhecerá — no ano seguinte — o desterro na ilha de Fuerteventura, no arquipélago das Canárias. Indultado alguns meses depois, prolongará voluntariamente o seu exílio, em França, até à destituição do ditador em 1930. No seu regresso, será entusiasticamente recebido em Madrid e Salamanca. Com o triunfo da República, em 1931, recupera o cargo de reitor da sua Universidade. É também nomeado presidente do Conselho de Instrução Pública e eleito deputado. Em 1934, decide jubilar-se da sua actividade como professor, mas mantém-se como reitor. Porém, o irrequieto Unamuno voltará a ter problemas políticos. Desiludindo-se com a República, faz críticas ferozes e será novamente destituído desse cargo. Inesperadamente, dará o seu apoio ao golpe militar de 1936. Como recompensa, o general Cabanellas restituir-lhe-á o lugar de reitor. Mas o namoro dura muito pouco. Poderia o seu espírito liberal pactuar com a violência e arrogância dos nacionalistas? Na abertura do ano lectivo de 1936-1937, proferirá (no dia 12 de Outubro) o seu famoso e definitivo discurso ("vencereis mas não convencereis"), respondendo ao não menos famoso grito do general Millán Astray: "¡Muera la inteligencia! ¡Viva la muerte! Novamente apeado da reitoria, agora pela assinatura do general Franco, permanecerá em prisão domiciliária até ao último dia de vida: 31 de Dezembro de 1936.

A curta distância entre a cidade de Salamanca e a fronteira portuguesa deverá ter estimulado em Unamuno o interesse por Portugal; mas a verdade é ele vivera vários anos muito mais perto de França, país que visitou amiudadas vezes e onde residiu os seus seis anos de exílio provocado pela ditadura do general Primo de Rivera, e, apesar disso, não existem na obra unamuniana, para com a França, as manifestações de simpatia que Portugal lhe mereceu. E essa admiração tinha três vectores: Unamuno amou a nossa literatura: particularmente a produzida pelos grandes autores da "geração de 70" (Eça de Queirós, Antero de Quental, Oliveira Martins, João de Deus) e também a obra de Camilo Castelo Branco, nomeadamente o romance que considerava "um dos livros fundamentais da literatura ibérica, o Amor de perdição; amou a paisagem física de Portugal, que lhe mereceu a escrita de belas páginas, sobretudo registadas no livro que publicou em 1911: Por tierras de Portugal y España; mas amou, provavelmente acima de tudo, a paisagem humana de Portugal, a "paisagem da alma", para utilizar palavras do próprio Unamuno. Sobre Por tierras de Portugal e Espanha, escreveu n’A Águia Teixeira de Pascoais: "Não sei se este livro, simplesmente admirável, foi lido em Portugal. É de crer que não. E todavia nada se escreveu em livros estrangeiros, a nosso respeito, de mais belo, de mais profundamente interessante e verdadeiro. A nossa paisagem e a nossa alma aparecem, ali, surpreendidas nos seus aspectos mais ocultos,
transcendentais e originais". A lusofilia de Unamuno — não isenta, contudo, de sentido crítico — mereceu inclusivamente que um ilustre poeta seu contemporâneo, o Prémio Nobel Juan Ramón Jiménez, o classificasse, tal como a Antonio Machado — este verdadeiramente descendente de portugueses — de "poeta hispano-portugués".

Com os seus contemporâneos portugueses, o reitor de Salamanca viria a relacionar-se estreitamente, particulamente com Guerra Junqueiro, Teixeira de Pascoaes, Eugénio de Castro, Manuel Laranjeira e Fidelino de Figueiredo, com os quais trocaria vasta correspondência. No seu monumental ensaio, intitulado Unamuno e Portugal, Julio García Morejón estuda em todos os seus ângulos os laços de afecto que uniram Miguel de Unamuno ao nosso país. A verdade é que o prestígio do autor de En torno al casticismo era já tão grande por volta de 1915 — e não apenas na Península Ibérica — que os jovens escritores da revista Orpheu, apesar de o considerarem um lepidóptero (vocábulo que usavam pejorativamente para designar todos aqueles que eram incapazes de compreender a sua estética) lhe enviaram a revista. Além disso, alguns aspectos do sebastianismo pessoano têm claramente em Unamuno um precursor, sendo óbvia a influência de um soneto deste autor espanhol na concepção geral da Mensagem de Pessoa, e particularmente no poema de abertura: "A Europa jaz, posta nos cotovelos", etc.

O soneto de Unamuno foi publicado n’A Águia em Fevereiro de 1911, pelo que era impossível que Pessoa o desconhecesse. Reza assim:

Del atlántico mar en las orillas
desgreñada y descalza una matrona
se sienta al pie de sierra que corona
triste pinar. Apoya en las rodillas

los codos y en las manos las mejillas
y clava ansiosos ojos de leona
en la puesta del sol; el mar entona
su trágico cantar de maravillas.

Dice de luengas tierras y de azares
mientras ella sus pies en las espumas
bañando sueña en el fatal imperio

que se le hundió en los tenebrosos mares,
y mira cómo entre agoreras brumas
se alza Don Sebastián, rey del misterio.

O primeiro escritor português com que Unamuno estabeleceu uma relação de amizade, provavelmente em 1898, foi Guerra Junqueiro. O encontro teve lugar em Salamanca e até esse momento Unamuno não conhecia Portugal. Em 1904 visitou Coimbra, e aí travou conhecimento com Eugénio de Castro e Silva Gaio. Eugénio de Castro era nessa época um poeta muito popular em Espanha e em todos os países de língua espanhola. O poeta nicaraguense Rubén Darío, líder espiritual dos jovens escritores "modernistas" hispánicos, considerava o vate coimbrão um dos pilares da poesia simbolista e incluíra-o entre os homenageados no seu ensaio Los raros, dedicado aos mestres da moderna literatura. Curiosamente, Unamuno, que não conseguia aderir ao preciosismo esteticista
de livros como Oaristos, Horas ou Belkiss (e chegara a declarar a sua incompreensão pelo êxito hispano-americano de Castro, acabou por se transformar num dos seus grandes amigos e por prefaciar, em 1913, a edição espanhola de Constância.

Coimbra fascina o poeta, que deixou vários testemunhos escritos da emoção causada pela conjugação da paisagem física e humana da velha cidade do Mondego, "donde resbala el Mondego entre los chopos sollozando las estrofas que Camões dedicó a Inés de Castro y murmurando cantos de João de Deus".

Em 1906, Unamuno conhece, no Porto, o poeta Teixeira de Pascoaes. No ano seguinte viaja até Amarante, que lhe provoca também grande emoção, confessada numa carta ao poeta catalão Joan Maragall: "A donde ansío volver pronto es a Portugal. Qué días pasé el verano en Amarante! Rincón delicioso. Pero ese pobre país está perdido; está purgando, a mi juicio, su independencia". Como se pode ver, começa aqui a expressar-se a especifica visão unamuniana de Portugal, país que considerará, numa carta enviada de Lisboa: "Hermosamente triste y tristemente hermoso". A partir daí fará incontáveis viagens ao nosso país, tirando partido do facto de — por pertencer à administração da companhia de Caminhos de Ferro Salamanca-Fronteira Portuguesa — poder viajar gratuitamente de comboio.

Algumas vezes veraneará em praias portuguesas (Espinho e Figueira da Foz). Na primeira destas praias travará conhecimento e tornar-se-á amigo Manuel Laranjeira, cujo pessimismo parece ter consolidado a imagem unamuniana do fatalismo português. Não é por acaso que mais de um terço do texto do ensaio intitulado "Un pueblo suicida", escrito em Lisboa em 1908 e integrado em Por tierras de Portugal e Espanha, é constituído por uma carta de Laranjeira, ele próprio um futuro suicida. Mas não se pense que, para Unamuno, Portugal é um país de suicidas apenas porque se suicidaram alguns dos nossos mais notáveis escritores (Antero e Camilo, nomeadamente). Portugal é um país suicida porque deixou de olhar para o futuro, de ter um verdadeiro ideal nacional. Para o reitor de Salamanca, o povo português, meigo na aparência, era, no seu íntimo, violento e apaixonado. A sua condenação à inércia metamorfoseava-se em impulso suicida (passo a citar pela tradução de José Bento: "A paixão trá-lo à vida, e a própria paixão, consumido o seu alimento, leva-o à morte. Hoje o que lhe resta? Dentro de uns dias, em 1 de Dezembro, celebrar-se-ão as festas da restauração da sua nacionalidade, de ter sacudido a soberania dos Filipes da Espanha. No dia seguinte voltarão a falar de bancarrota e de intervenção estrangeira. Pobre Portugal!"

Mas falemos, muito sinteticamente, de outros aspectos da vida e da obra de Unamuno. Há que destacar a inexistência de uma clara separação entre os problemas tratados pelo literato, ou seja, o contista e romancista, o poeta ou o dramaturgo e o pensador. O debate das questões relativas à unidade e pluralidade do ser, à imortalidade da alma humana e em geral à fé religiosa é simultaneamente travado na ficção romanesca, no ensaio propriamente dito, na poesia ou nos palcos teatrais. Se quisermos ser mais restritivos, poderemos dizer, como Ángel del Río, que toda a obra de Unamuno se unifica em torno a a dois temas ou obsessões: "a obsessão por descobrir a essência de Espanha e o anseio dramático, trágico, de encontrar uma finalidade para a vida, a história e o destino do homem concreto e pessoal, o ‘homem de carne e osso’ ".

Em Salamanca, ainda hoje é bem visível, na história e na lenda, a veneração que lhe merece o seu mais prestigiado reitor. Entre as múltiplas histórias unamunianas que correm na cidade, há uma que gostaria de recordar. A belíssima fachada plateresca da Universidade é desde há séculos contemplada por salmantinos e forasteiros que diariamente ali acorrem. Contudo, por estranho que pareça, grande parte dos visitantes, mais do que deleitar-se com a observação desta obra artística, procura localizar uma rã esculpida sobre uma das três caveiras que entram na decoração em alto relevo. Conta-se que um dia o reitor Unamuno contemplava da janela da reitoria, com visível satisfação, um grupo de estudantes que observava a fachada. O escritor dirigiu-lhes então a palavra, encarecendo a beleza do monumento. Os estudantes responderam-lhe que não estavam a apreciar a fachada, mas a procurar "la rana". O humor de Unamuno mudou imediatamente, e disparou: "No es una rana, es un sapo!".

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RE: Miguel de Unamuno e o seu amor a Portugal.

#85911 | fg | 10 mar 2005 12:45 | Em resposta a: #85859

Caro José Pedro Castro

É com enorme prazer que recebo os seus textos, desta vez palavras referentes ao grande Miguel de Unamuno, a admiração que teve pela geração de 70 (Antero de Quental, Eça de Queirós, Teófilo Braga, Oliveira Martins) conjunto de intelectuais que tinham por missão europeizar Portugal, terminar com o seu passado arcaico, um país que não tinha sofrido os efeitos da Revolução Industrial, um país imensamente católico, sem lugar para a reflexão individual e para o espírito crítico.

Unamuno encontrou um Portugal arcaico e rural, com uma grande dificuldade de se aproximar de uma Europa ilustrada e já com um discurso crítico; e impressionou-lhe um povo pessimista, impregnado dessa melancolia que, por outro lado, lhe deixou fascinado ( um povo "com um sentimento trágico da existência e um complexo pendor para a melâncolia" ; "é a imagem que se costuma evocar de um povo que canta o fado ou que no fado se canta" segundo as suas próprias palavras.)

É sabida a atracção que exerceu em Unamuno o mito de D. Sebastião. E foi Oliveira Martins, o mitólogo da nossa história, que concedeu ao sebastianismo o estatuto de mito cultural " a manifestação mais palpável do espírito nacional, que continuou impregnada no imaginário colectivo do povo português, nele nutrido pelo conhecimento da decadência nacional e pela recordação de tempos mais felizes".

O seu encontro com Teixeira de Pascoais foi de uma grande importância para o seu conhecimento profundo da afecção da alma chamada de saudade, sentimento que para Pascoaes era como um regresso ao paraíso, este regresso não era nostalgia, que é perda ou ausência, confiando-lhe a misão de transformar a perda em vitória do sonho.

Os meus cumprimentos

Francisco Guimarães

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RE: Miguel de Unamuno e o seu amor a Portugal.

#85912 | fg | 10 mar 2005 12:53 | Em resposta a: #85911

"O encontro com Teixeira de Pascoais" e não "o seu encontro com..."; ai esta gramática... peço desculpa, mas escrevo rápido e sem tempo para rever.

Francisco

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RE: Dos literatos e pensadores ao foro cientifico…

#86286 | jpbabc | 16 mar 2005 09:53 | Em resposta a: #85912

Caro Francisco Guimarães,


Camilo e Eça, para falar apenas dos nossos, souberam descrever com mestria, ao longo da sua obra, um dos sentimentos mais auto destrutivos da condição humana: a inveja.

Os psicólogos e demais cientistas da área comportamental, bem como filósofos, continuam ainda hoje a tentar escalpelizar esta espécie de pulsão de aversão que, com treino e perseverança, pode ser ultrapassado e sublimado.

Há uma história sobre um mestre idoso e coberto de honrarias que se encontrava à morte. Os seus discípulos perguntaram: “Mestre, estás com medo de morrer ?” “Estou”, respondeu ele, “porque temo o encontro com Deus”. “Mas como ?”, perguntou um discípulo, “sempre tiveste uma vida exemplar e como Moisés, tiraste-nos das trevas da ignorância e fizeste julgamentos justos como Salomão !”, retorquiu outro discípulo. O mestre respondeu: “Quando eu me encontrar com Deus, Ele não me irá perguntar se eu fui Moisés, ou se eu fui Salomão. Ele ir-me-á perguntar apenas se eu fui eu mesmo”.

O juízo que os outros fazem dos nossos actos nem sempre corresponde àquilo que sentimos dentro da nossa legitimidade; tal mecanismo é a mola propulsora da inveja porque os outros vêm a superfície, julgam e emitem a sua opinião sempre no sentido de sentir, no caso da inveja, as qualidades do outro, esquecendo-se das suas próprias.
O ser humano é dotado de sentimentos positivos, que se retratam nas suas acções de filantropia e relações afectivas quer como pai, irmão, amigo, etc., mas também é dotado de sentimentos negativos, sendo um dos graus mais elevados a inveja, da qual se origina o ciúme, as mágoas, a baixa estima, a falta de iniciativa em fazer o que os vitoriosos fazem, etc.

Não há sentimento mais destrutivo para o clima das relações humanas do que o ciúme e a inveja que gera o ódio, a mágoa e o rancor.

A inveja é formada a partir do momento em que se comparam as qualidades do outro sem uma avaliação do próprio potencial, na qual a pessoa se julga incapaz de realizar as suas acções, criando fortes sentimentos de inferioridade e de frustração, porque hipoteticamente sente-se inferior à pessoa invejada.

Sedimenta-se assim o complexo de inferioridade, caracterizado por uma forte impregnação emocional, total ou parcialmente reprimida, determinando atitudes comportamentais reprováveis.

A comparação que fazemos entre nós e o outro pode ser de âmbito geral quando comparamos as qualidades psicológicas, morais, sociais ou espirituais e pode ser específica quando comparamos posses materiais, tais como casa, carro, roupa, dinheiro, porte físico, etc.

Faz parte da trama da inveja, a vanglória. Quando nos enaltecemos, como ensina a Psicossociologia, no fundo estamos a procurar evitar o mal-estar do desequilíbrio, pregando excessivamente as nossas próprias qualidades com o único intuito de diminuir o outro. A crítica é uma das máscaras da inveja porque, quando criticamos alguém de forma destrutiva, e quando temos necessidade de falar mal de alguém, provavelmente estamo-nos a sentir inferiores a ele. A inveja é pois a incapacidade de ver a luz das outras pessoas, seja em que aspecto for, assim como a incapacidade de aceitar o valor dos outros, que é possível com esforço próprio possuí-lo e assim desaparecerá a causa da auto-aversão por não sermos como os outros são, assim como, a auto-rejeição que pode estereotipar a mediocridade do invejoso.

A sociedade em que vivemos está baseada na competição desenfreada, calcada numa antropofagia violenta de que o outro não pode ser melhor, é uma das grandes responsáveis de um mundo repleto de desamor social.

O sol quando nasce é para todos, diz o adágio popular e, portanto, cada um de nós tem as suas próprias peculiaridades e capacidades e assim, com força de vontade, todos podem tornar-se vitoriosos e não perder o seu precioso tempo a almejar o que o outro faz, deixando de construir o seu próprio mundo, porque a preocupar-se com os outros não avalia os índices do seu crescimento, dado haver uma grande diferença entre a comparação com os outros e a comparação connosco próprios.

Na auto-comparação cria-se o ponto de valorização pessoal e passa-se a reconhecer a própria capacidade, afastando o destrutivo principio do que os outros vão achar de mim.
Ora, se proclamamos permanentemente o direito à liberdade porque razão havemos de ficar a depender dos outros, a copiar e a escravizarmo-nos aos seus padrões ?

A individualidade é conseguida quando captamos o nosso potencial e procuramos ampliá-lo, enriquecendo-nos cada vez mais e, assim, estamos a dar as costas à tenebrosa e mesquinha inveja dos outros.

Desta forma, quando estamos centrados na nossa real dimensão pelo que já somos, pelo que já temos, evitaremos a admiração invejosa pelos outros, que faz cair a auto estima, diminuindo sensivelmente o valor próprio e deixando de cumprir a máxima "Ama-te para amares".

Normalmente, o invejoso não se ama, vai se auto destruindo quer fisicamente pelas psicossomatizações e psicologicamente destruindo a sua auto-aceitação, ponto de apoio de todo o sucesso pessoal.

Não se deve perder tempo a invejar os outros. Em vez disso, é salutar pensar que todos nós fomos dotados por Deus com as mesmas faculdades das pessoas que cada um de nós inveja.

Os meus melhores cumprimentos,

José Pedro Castro

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RE: Onde terá nascido o Bisavô de Jorge Luís Borges ?!

#86459 | nresende | 18 mar 2005 12:24 | Em resposta a: #85673

Ora aí está uma pergunta à qual adoraria responder. Borges sempre me fascinou e continua a fascinar, sempre que releio as páginas das suas obras.
Um apontamento curioso: em Torre de Moncorvo existe uma rua com o seu nome, aludindo certamente às suas raízes.
Talvez a obra do Abade de Baçal tenha alguma pista ou alguma monografia local refira os antepassados de Jorge Luís. Seria interessante encontrá-los e com certeza uma honra para Portugal. Afinal Borges nunca ganhou o Nobel porque não era marxista, mas merecia-o do que qualquer um dos últimos 10 premiados.
Cumprimentos

Nuno Resende

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RE: Para todos quantos apreciam Jorge Luís Borges

#86513 | jpbabc | 19 mar 2005 14:11 | Em resposta a: #86459

Caro Nuno Resende e todos quantos apreciam Jorge Luís Borges,


Partilho inteiramente do seu fascínio pelo autor de “Ficciones”.

Já que estamos em pleno fim-de-semana, aqui deixo para vosso deleite, algumas frases que exprimem a sua incomparável genialidade.

Os meus cumprimentos,

José Pedro Castro







Pensamentos de Jorge Luís Borges,



Uno está enamorado cuando se da cuenta de que otra persona es única.

Yo no hablo de venganzas ni perdones, el olvido es la única venganza y el único perdón.

He cometido el peor pecado que uno puede cometer. No he sido feliz.

Uno no es lo que es por lo que escribe, sino por lo que ha leído.

He sospechado alguna vez que la única cosa sin misterio es la felicidad, porque se justifica por sí sola.

Hay que tener cuidado al elegir a los enemigos porque uno termina pareciéndose a ellos.

La duda es uno de los nombres de la inteligencia.

La muerte es una vida vivida. La vida es una muerte que viene.

Si de algo soy rico es de perplejidades y no de certezas.

Sólo aquello que se ha ido es lo que nos pertenece.

Quizá haya enemigos de mis opiniones, pero yo mismo, si espero un rato, puedo ser también enemigo de mis opiniones.

¿De qué otra forma se puede amenazar que no sea de muerte? Lo interesante, lo original, sería que alguien lo amenace a uno con la inmortalidad.

La belleza es ese misterio hermoso que no descifran ni la psicología ni la retórica.

Para el argentino, la amistad es una pasión y la policía una mafia.

Que el cielo exista, aunque nuestro lugar sea el infierno.

Somos nuestra memoria, somos ese quimérico museo de formas inconstantes, ese montón de espejos rotos.

Hay comunistas que sostienen que ser anticomunista es ser fascista. Esto es tan incomprensible como decir que no ser católico es ser mormón.

Creo que con el tiempo mereceremos no tener gobiernos.

Estoy solo y no hay nadie en el espejo.

La literatura no es otra cosa que un sueño dirigido.

El infierno y el paraíso me parecen desproporcionados. Los actos de los hombres no merecen tanto.

Ordenar bibliotecas es ejercer de un modo silencioso el arte de la crítica.

Siempre he sentido que hay algo en Buenos Aires que me gusta. Me gusta tanto que no me gusta que le guste a otras personas. Es un amor así, celoso.

La Universidad debiera insistirnos en lo antiguo y en lo ajeno. Si insiste en lo propio y lo contemporáneo, la Universidad es inútil, porque está ampliando una función que ya cumple la prensa.

Antes las distancias eran mayores porque el espacio se mide por el tiempo.

No eres ambicioso: te contentas con ser feliz.

Que otros se jacten de las páginas que han escrito; a mi me enorgullecen las que he leído.

Democracia: es una superstición muy difundida, un abuso de la estadística.

El tema de la envidia es muy español. Los españoles siempre están pensando en la envidia. Para decir que algo es bueno dicen: "Es envidiable".

Yo no bebo, no fumo, no escucho la radio, no me drogo, como poco. Yo diría que mis únicos vicios son El Quijote, La divina comedia y no incurrir en la lectura de Enrique Larreta ni de Benavente.

La Biblioteca es una esfera cuyo centro cabal es cualquier hexágono, cuya circunferencia es inaccesible.

Me gustaría ser valiente. Mi dentista asegura que no lo soy.

Que cada hombre construya su propia catedral. ¿Para qué vivir de obras de arte ajenas y antiguas?

La paternidad y los espejos son abominables porque multiplican el número de los hombres.

La felicidad no necesita ser transmutada en belleza, pero la desventura sí.

Las tiranías fomentan la estupidez.

El tiempo es la materia de la que he sido creado.

Deporte: yo creo que habría que inventar un juego en el que nadie ganara.

El tiempo es el mejor antologista, o el único, tal vez.

Si viéramos realmente el Universo, tal vez lo entenderíamos.

El tiempo es la sustancia de la que estoy hecho.


Dicen que soy un gran escritor. Agradezco esa curiosa opinión, pero no la comparto. El día de mañana, algunos lúcidos la refutarán fácilmente y me tildarán de impostor o chapucero o de ambas cosas a la vez.

He firmado tantos ejemplares de mis libros que el día que me muera va a tener un gran valor uno que no lleve mi firma.

No sé hasta qué punto un escritor puede ser revolucionario. Por lo pronto, está trabajando con el idioma, que es una tradición.

Nadie es patria, todos lo somos.

Quienes dicen que el arte no debe propagar doctrinas suelen referirse a doctrinas contrarias a las suyas.

Yo siempre seré el futuro Nóbel. Debe ser una tradición escandinava.

La Historia Universal es la de un solo hombre.

Dólares: Son esos imprudentes billetes americanos que tienen diverso valor y el mismo tamaño.

Biografías: Son el ejercicio de la minucia, un absurdo. Algunas constan exclusivamente de cambios de domicilio.

No he cultivado mi fama, que será efímera.

Yo creo que es mejor pensar que Dios no acepta sobornos.

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